Kelvin,Thalita,Mayara e João vitor
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"Mas..." diria ainda o leitor: "... e quando o homem não estava presente em tais regiões, no passado remoto, incêndios desastrosos também não ocorriam em conseqüência dos raios? Não seria melhor deixar queimar, então, naturalmente?". Grandes incêndios certamente ocorriam, só que não eram desastrosos. Não existiam cercas de arame farpado prendendo os animais. Eles podiam fugir livremente do fogo, para as regiões vizinhas. Por outro lado, áreas eventualmente dizimadas pelo fogo podiam ser repovoadas pelas populações adjacentes. Hoje é diferente. Além das cercas, a vizinhança de um Parque Nacional ou qualquer outra unidade de conservação, é formada por fazendas, onde a vegetação e a fauna natural já não mais existem. O Parque Nacional das Emas, no sudoeste de Goiás, por exemplo, é uma verdadeira ilha de Cerrado, em meio a um mar de soja. Se a sua fauna for dizimada por grandes incêndios, ele não terá como ser naturalmente repovoado, uma vez que essa fauna já não mais existe nas vizinhanças. Manejar o fogo em unidades de conservação como esta é uma necessidade urgente, sob pena de vermos perdida grande parte de sua biodiversidade.
Se considerarmos que cerca de 45% da área do Domínio do Cerrado já foram convertidos em pastagens cultivadas e lavouras diversas, é extremamente urgente que novas unidades de conservação representativas dos cerrados sejam criadas ao longo de toda a extensão deste Domínio, não só em sua área nuclear mas também em seus extremos norte, sul, leste e oeste. A criação de unidades de conservação com áreas menos significativas não deve, todavia, ser menosprezada. Quando adequadamente manejadas, elas também são de enorme importância para a preservação da biodiversidade. Só assim se conseguirá, em tempo, conservar o maior número de espécies de sua rica e variadíssima flora e fauna.
A grande maioria das atuais unidades de conservação, sejam elas federais, estaduais ou municipais, acha-se hoje em uma situação de completo abandono, com sérios problemas fundiários, de demarcação de terras e construção de cercas, de acesso por estrada de rodagem, de comunicação, de gerenciamento, de realização de benfeitorias necessárias, de pessoal em número e qualificação suficientes etc. Quanto ao manejo de sua fauna e flora, então nem se fale. Pouco ou nada se faz para conhecer as populações animais, seu estado sanitário, sua dinâmica etc. Admite-se "a priori" que elas estão bem pelo simples fato de estarem "protegidas" por uma cerca, quando esta existe. Na realidade, isto poderá significar o seu fim. Problemas deconsangüinidade, viroses, verminoses, epidemias, poderão estar ocorrendo entre os animais, dizimando-os dramaticamente, e nem se sabe disto. Pesquisas a médio e longo prazo são essenciais para que possamos compreender o que acontece com as populações animais remanescentes nos cerrados. Paralelamente, espécies exóticas de gramíneas, principalmente as de origem africana, como o capim-gordura, o capim-jaraguá, a braquiária, estão invadindo estas unidades de conservação e substituindo rapidamente as espécies nativas do seu riquíssimo estrato herbáceo/subarbustivo. Dentro de alguns anos, ou décadas que seja, estas unidades transformar-se-ão em verdadeiros pastos de gordura, jaraguá ou braquiária e terão perdido, assim, toda a sua enorme riqueza de espécies de outrora.